segunda-feira, 29 de março de 2010

Doze anos


Quem tem filho já passou por isso, ou vai passar.

Quem não tem, está livre do constrangimento. Livre também de muitas outras coisas, como a primeira noite. Ah, a primeira noite. Ô, enfermeira, chega aqui por favor. É assim mesmo, faz esse barulho todo quando dorme? E o tamanho, tô achando ela muito pequena, só quarenta e poucos centímetros, dois quilos e quatrocentos, tem como pesar de novo, não tô confiando nessa balança não, a mãe engordou 19 quilos, posso pesar ela aqui embaixo na farmácia? Dona enfermeira, a senhora me desculpe ficar chamando toda hora, é normal esse roxo em volta do olho, e de um olho só? Mainha vai achar que eu já deixei ela cair... Eu sei que a senhora pediu para só apertar o botãozinho em caso de emergência de verdade, mas é sério, o peito dela não sobe e desce, tem como conferir se tá respirando, se o coração tá batendo, pode deixar um estetoscópio aqui comigo? Enfermeira, enfermeira, estou sendo meio chato, mas garanto que esta é a última, tô preocupadíssimo, essa menina nasceu tem 19 horas e só faz dormir, até para mamar foi dormindo, não é possível, tudo bem que ela é filha de baiano, mas tem limite, né não?

Antes até, quem não tem filho está liberto da primeira imagem. Aquele exato momento em que você vê a figurinha pela primeira vez. O médico mostra todo orgulhoso: olha aí, Marcio, a dona Marisa, saudável e, para tranquilizá-lo, com só cinco dedos em cada mão, os mesmos apenas cinco que apareceram em todas as ecografias, apesar da sua desconfiança. Gente, tá toda amassada, e olha que foi cesária... É essa mesmo, o senhor acompanhou tudo, doutor, não trocaram não, né? Tem como amarrar uma fitinha do Senhor do Bonfim para não misturar?

Falar que a primeira imagem é a que fica é ridículo. Se, quando fecho os olhos para as orações no fim do dia, o rosto da Florzinha que me aparecesse fosse aquele de filhote-de-sharpei-com-dor-de-bariga, certamente eu teria pesadelo toda noite. Pessoas, eu estou falando sério, a menina não tinha cabeça, era um cone que mais parecia um ovo de avestruz. E cabia inteirinha na palma de minha mão.

Os não-pais também são poupados do primeiro banho. É assim, sua sogra resolve visitar parentes em outro estado justamente na semana do parto, aí você traz sua mãe da Bahia para ajudar nos primeiros dias, já que nem você ou sua esposa tocaram em um recém-nascido antes. Tudo certo, vocês voltam para casa depois de dois dias no hospital. No fim do dia, sua mãe pergunta: e quem vai dar banho nela? Como assim, mainha, quem vai dar banho nela, a senhora é mãe de quatro? Ah, meu filho, eu nunca dei banho em vocês nessa idade não, quem fazia isso era sua tia Anete. O quê? Por que a senhora não falou antes? Eu importei a pessoa errada! E lá vai você sozinho, a esposa toda estrupiada em um pós-cesária complicadíssimo, dar o primeiro banho.

Outra de que os não-pais são poupados é do ensino a pedalar. Papai, eu vou cair? Vai, com certeza. E vai machucar? Pode ser que sim, pode ser que não. Você vai segurar? Vou, até você conseguir se equilibrar sozinha. Então, tá, não solta não. Vai pedalando, Pequena, vai pedalando. Não solta, papai, não solta. Tô segurando, menina, tô segurando, oxente! Segura, Papai, segura, que eu não consigo ficar sozinha, não solta, não solta! E você, que já está só assistindo há uns 15 metros, se desespera: eu esqueci de explicar como faz a curva...

Quem não é pai também fica livre das fraudas. Mainha diz que cocô de bebê não fede, só se foi o dos filhos dela, porque o da Marisa era phooooda. Pior que o dela, só o dos outros. Estava a Pequena feliz da vida na piscina de bolinhas do shopping, a mãe às compras. Daí a funcionária do parquinho, meio sem jeito, moço, acho que sua filhinha fez cocô... Não, não era dela. Algum bunda-mole cagou a piscina de bolinha inteira. Caos total, parque interditado, cinco funcionários em volta e sua filhota toda embostalhada, e com a merda dos outros. E a mãe, que levou a tradicional sacolinha de fraudas e roupas extras, ainda fica sem bateria no celular.

E os primeiros passos? Só não sendo pai para saber a tranquilidade que é a vida sem os primeiros passos. Olha a mesa, ela tá indo no rumo da mesa, vai bater bem na quina! Isa, ela ta correndo em direção à parede, segura. Calma, meu amor, ela vai parar. Puf, tá lá o galo crescendo. Minha senhora, pelamordedeus, me desculpe, é que ela está aprendendo a andar e só para quando atinge um obstáculo sólido, no caso, suas pernas.

Quem não é pai está livre destas e de muitas outras, mas quem tem prole um dia tem de respoder à pergunta: como eu nasci?

Depois de todas as enrolações de praxe - cegonha, abóbora, sementinha, roda dos enjeitados, como hoje a Marisete completa 12 anos, é hora de contar a verdade. Pequena, você chegou voando, como fazem todos os anjos.

Quem não é pai da Marisa, está livre de ser feliz.

Beijos só para a Florzinha, saudades de todos,

2 comentários:

Trícia disse...

Amei :)))

E parabéns para Florzinha.

Saudades...

Da Dinda que finalmente virou e descobriu que o primeiro banho de filho nossa, não há experiência anterior que valha.

Beijos a suas mulheres... forte e felizes

Tânia Mendes disse...

Querida priminha, saúde, felicidades, muitas alegrias e feliz retorno ao nosso amado, idolatrado, salve, salve, Brasil kkkkkkkkkkkkkk.
Muitas saudades de vcs.
Bjim.